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19/12/2011
Casamento à vista, mas com divisão total de bens
 
Semana passada, os países membros do Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) deram mais um passo de aproximação de suas economias ao assinarem, em Genebra, na Suíça, uma declaração de cooperação econômica, comercial e de investimento para estimular a economia mundial. Especialistas, no entanto, veem a iniciativa com ressalvas, comparando-a a um casamento com divisão total de bens, em que ninguém pretende ceder sobre questões ligadas à tarifas de importação e subsídios a alguns setores. O encontro também foi marcado por uma exibição de força das cinco nações do bloco, agora reforçado pela África do Sul, que querem manter o direito de elevar tarifas e adotar medidas protecionistas, numa clara resposta às propostas dos desenvolvidos.
Fernando Pimentel (MDIC) e Antonio Patriota (MRE) assinam acordo com o ministro do Comércio chinês, Chen Deming (Gustavo Ferreira/MRE)
Apesar das discussões em torno da flexibilização do comércio, que, hoje, colocam emergentes e desenvolvidos em lados opostos, o encontro em Genebra sinalizou mais uma vez que os países do Bric ensaiam uma aproximação . Embora veja com bons olhos o acordo, Mauro Rochlin, professor de Economia do FGV Management, não consegue ver a aliança sair do papel sem uma forte adesão da China.
“Neste momento de retração na Europa e nos Estados Unidos, os chineses são os principais atores da economia mundial. Para que haja uma melhora nas relações comerciais com outros países, no entanto, o gigante asiático terá que abrir mão de algumas questões que, de certa forma, dão sustentação ao seu crescimento no comércio, como barreiras alfandegárias, subsídios, e, acima de tudo, o câmbio. A artificial desvalorização do yuan estimula uma guerra cambial que afeta todos os seus parceiros comerciais”, avalia Rochlin, lembrando que a China é a uma das principais concorrentes do Brasil nos setores de confecção, móveis e calçados.
E, de fato, a aliança parece ser mais frágil do que o discurso aparenta. Ainda em Genebra, enquanto os chineses criticavam as barreiras brasileiras no setor automotivo e agrícola, ministros do Brasil e da África do Sul se reuniam para tratar do protecionismo mútuo que os afeta: Pretória se queixa das barreiras impostas ao vinho sul-africano e o Itamaraty contesta o bloqueio à carne suína. “Como aproximar essas economias se, por exemplo, o Brasil também questiona os subsídios agrícolas na França e a Índia faz o mesmo com seus produtores rurais?”, reforça Rochlin.
No encontro, os emergentes ratificaram a posição contrária à demanda dos desenvolvidos sobre as tarifas de importação (Gustavo Ferreira/MRE)
Apesar das discordâncias comerciais, o encontro serviu para o bloco reforçar sua posição privilegiada em meio aos problemas nas economias centrais. Outro impulso para isso foi o ingresso da Rússia na OMC, formalizada na última sexta-feira, após 18 anos de longas negociações. O certo é que, hoje, o Bric é encarado como um player global, capaz até de ajudar nações em dificuldades – algo inimaginável décadas atrás. Ainda assim, mais uma vez opiniões divergentes impedem uma ação mais efetiva dos emergentes.
Discussões sobre a ajuda à parte, o bloco parece consciente dessa necessidade. Enquanto a China já se colocou à disposição do esforço internacional para ajudar a Europa, o mesmo o fez o Brasil. Para Mauro Rochlin, uma das melhores maneiras seria capitalizar o Fundo Monetário Internacional (FMI), como propôs recentemente a presidente Dilma Rousseff.
“Na década de 1980, não se via movimentos de países desenvolvidos para salvar países como o Brasil, o México e a Argentina, que sofriam com os efeitos de elevada dívida externa. Estas nações receberam recursos do FMI e foram obrigadas a cumprir um rigoroso programa de austeridade fiscal. Por que não se repete a mesma estratégia com a União Europeia? Foram criados mecanismos de ajuda aos sistemas bancários justamente para esse tipo de caso”, questiona.
Fonte: BB
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